Círio de Nazaré: Procissão foi a mais rápida da história
O Círio deste ano foi o mais rápido da história. A procissão que começou um pouco depois das 6 horas conseguiu chegar às 11h55 ao santuário de Nazaré, numa grande demonstração de organização - e cinco minutos antes da chegada do ano passado, até então a mais rápida dos círios.
Às 11h50 os sinos da Basílica Santuário começaram a soar, anunciando a chegada da Berlinda e dos romeiros. Dez minutos antes, os promesseiros da corda começavam a chegar em frente à praça, muito esgotados.
A diretoria da festa comemorou a organização da procissão e por terem conseguido cumprir o planejamento da imagem chegar à Praça Santuário ao meio-dia. O coordenadora da Festa de Nazaré, César Neves, disse que todos que trabalharam na organização da procissão estavam muito satisfeitos com o sucesso da romaria e com a compreensão dos romeiros, que ajudaram a conduzir o cortejo com a devida rapidez e na paz.
O arcebispo de Belém, ainda cansado do cortejo, se disse impressionado com a fé e devoção do povo paraense à Virgem de Nazaré - essa foi a sua primeira participação no Círio. Ele conclamou aos paraenses a permanecerem na fé e promover a cultura de paz durante toda a quadra nazarena e nos meses seguintes. “O Círio é a maior demonstração de amor por Maria”, afirmou dom Alberto Taveira.
Ativistas pela paz de vários Estados brasileiros vieram participar do Círio de Nazaré a convite do Movimento pela Vida (Movida), criado por pessoas que perderam seus parentes, vitimados pela violência. Eles se juntaram à CNBB para realizar a 1ª Romaria pela Paz e garantem que no próximo ano estarão de volta para realizar a segunda versão do movimento pela vida e pela paz.
Recorde de fiéis: 2,2 milhões
A multidão que este ano acompanhou o Círio de Nazaré, num trajeto de 4,6 quilômetros pelas ruas do centro de Belém, bateu todos os recordes nos 218 anos em que a romaria é realizada: 2,2 milhões de fiéis, segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
A maior manifestação católica do mundo, incluindo o próprio Círio e as procissões que o antecedem, como as romarias rodoviária e fluvial, além da Trasladação, no sábado à noite, mobilizou cerca de 4,2 milhões de devotos de várias partes do Brasil e até do exterior.
As Forças Armadas e as Polícias Militar e Civil utilizaram dez mil homens e mulheres, acrescidos de doze mil voluntários da Cruz Vermelha, para garantir a segurança dos romeiros.
O novo arcebispo de Belém, dom Alberto Taveira, que antes dirigia a diocese de Palmas (TO), ficou impressionado com a devoção dos paraenses e também ao ver tanta gente nas ruas.
“É uma demonstração de fé única, que não pode ser descrita, mas vivida”, disse Taveira. O papa Bento XVI enviou mensagem ao povo paraense lida por dom Taveira antes do começo da romaria, durante missa na Catedral da Sé. “A devoção mariana contribui para a manifestação de fé, a união do povo católico, e reestrutura a igreja em torno de um só credo”, observou o papa.
Durante a romaria chamava atenção a quantidade de pessoas que pagavam promessas por graças alcançadas. O inglês Edward Powell, que viajou onze mil quilômetros para acompanhar o Círio pela primeira vez, não conteve a empolgação: “Nunca vi nada igual. O povo brasileiro tem uma fé que contagia qualquer um”.
Ao seu lado, o canadense Nelson Ratcliff, acrescentou ter ficado impressionado ao ver os 15 mil fiéis seguros à corda atrelada à Berlinda.
ORIGINAL
Ratcliff esteve em 2008 na peregrinação à Meca, na Arábia Saudita, a maior manifestação muçulmana do mundo oriental, mas garante que ela não se compara ao Círio dos paraenses, que para ele é, ao mesmo tempo, “transcendente e original”. Outro estrangeiro, o chileno Osvaldo Rozas, emocionou-se tanto que precisou de atendimento médico num dos postos da Cruz Vermelha. Com pressão alta e devido ao calor, ele chegou a desmaiar.
Depois de socorrido, Rozas declarou que era a quarta vez que vinha a Belém. Deixou a mãe em Santiago, onde mora, e veio pagar a promessa que fez à santa pelo restabelecimento da saúde de sua mãe.
Um rio de fé onde deságuam pessoas
Não é uma caminhada fácil. Em determinados pontos, as ruas se estreitam. As curvas acentuam-se. Fabiana, 16 anos, foi descalça. Não estava na corda, mas achou que era uma forma de dar sentido aos passos que dava, anônima na multidão. Os amigos Cleiton e Rômulo, 19 e 23 anos, ensopados, abandonaram a corda na subida da Presidente Vargas. Jogaram-se no gramado da Praça da República. Exaustos, mas felizes.
Dandara, nove anos, foi pendurada pelo pai num contador de poste. Na mão uma imagem pequena. Vestida com uma roupa branca, aguardava a passagem da berlinda.
Em Nazaré, a Associação das Vítimas de Erros Médicos utilizava o Círio para realizar um pequeno protesto. Cartazes na mão, iam em silêncio, lembrando parentes vitimados.
A caminhada começa cedo. Há quem acompanhe desde a saída. Há os que aguardam em algum ponto. Cada um tem os próprios motivos. Não dá para medir sacrifícios. Não há balança adequada para se medir a fé.
Jobson Pinheiro, 17 anos, distribuía água na esquina da Doutor Moraes. Perto dele, Maria das Graças, 28, iniciava, de joelhos, o pagamento da promessa.
Caminha-se. A direção é uma só. Ninguém pergunta a ninguém o motivo de se estar ali. Cada um traz a própria história. O homem que carrega um tijolo na cabeça é levado pela mesma devoção que o outro que carrega uma cruz. A mulher, que é empurrada na cadeira de rodas, agradece da mesma forma que a família endinheirada que enfeitou a casa e dispôs cadeiras e balões na avenida Nazaré para observar, de forma privilegiada, a passagem da procissão.
Esses caminhos que convergem, como pequenos braços de rios que formam um rio maior, dão sentido ao Círio de Nazaré. Nas mãos que se estendem aos céus, nas vozes que cantam e oram e nas lágrimas que descem e misturam-se ao suor. No dia seguinte restarão as marcas e as lembranças, até a próxima renovação da fé. (Diário do Pará)
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